Todo o foco,
lentes miradas para o tema tão recorrente em São Paulo, a questão envolvendo o
uso do álcool e outras drogas, em que a polêmica gira entorno do crack.
A relação
manicomial aparece novamente no cenário atual vestindo outra roupagem, o
tecnicismo parece estar mais afinado na prática e nos discursos de alguns
profissionais. Representantes da população, na figura de governadores,
deputados, prefeitos, vereadores, enfim, ações políticas que cercam o cenário
atual com a epidemia ao contrário. Ou seja, “soluções mágicas” lançadas pela
mídia e por figuras públicas que têm sobre as pessoas, certa influência,
funcionando assim: “ah, ele disse, então estou com ele”. Uma concordância
estranha, pois, não há na sociedade em geral uma discussão sobre os problemas
vivenciados nas diversas realidades. Parece ser um sintoma de todas as crises
vividas nas relações em sociedade, que são solucionadas rapidamente por meios
paliativos e por vezes violentos. A vida vai se estilhaçando numa realidade que
pouco permite encontros que provocam uma alegria, aumentando nossa
potência de existir.
Os
sentimentos, com toda sua parte extensiva, parecem logo ser aprisionado, numa
captura que rouba a possibilidade de existir.
As relações
que envolvem as pessoas usuárias de alguma droga restringe somente o que
(a)parece afligir as pessoas na sociedade. À cada artigo que crítica a forma
como está sendo feito as ações de internação involuntária e de internações
compulsória, vejo comentários do tipo desesperador que faz coro junto aos
representantes e profissionais que colocam essa possibilidade como sendo a
única e máxima salvadora dos problemas dos quais já conhecemos na nossa
realidade. É um grito de socorro, em que neles está todos os direitos que não
estão sendo garantidos, políticas públicas que não acontecem de fato e que
quando há, nem é tão pública assim. As pessoas parecem terceirizar o tempo todo,
como se autorizasse ao outro, o poder de decidir por elas. A vida fica amarrada
quase o tempo todo na decisão de alguém, alguém com esse “poder de solução
instantânea”, figuras públicas, pessoas que exercem uma influência sobre as
pessoas, a voz que vai se fazer ecoar por quase todas as pessoas.
Não está
sendo discutido a falta de programas e de funcionamento pleno do Sistema Único
de Saúde – SUS, nem se fala nas políticas que estão sendo elaboradas,
discutidas, planejadas, em saúde mental. É preocupante querer estancar uma
ferida que precise de ar para poder se recuperar, em que “tirar” as pessoas
desse lugar que incomoda, que expõe para nós algo bem próximo de nossa vida,
que visualiza para nós que as nossas relações não andam tão bem assim, e faz
tempo. A medida mais fácil para nós frente a qualquer problema e angústia,
parece ser o de de(s)xistir, em que desistimos dos outros com suas
singularidades e sofrimentos, desistimos de nós mesmos.
A saúde
sempre mostra alguns indicadores que quase sempre são ocultados, talvez, por
dizer de algo simples que nos é tão complicado, assim, a realidade vai
mostrando que sofremos de “relação”, aquela que vá para além de relações ditas
caridosas, dizendo muito mais daquelas que permitem um encontro, mesmo que esse
seja tão difícil pra gente, que permita o conflito – nosso e/com o outro. A
vida não pode estar comprimida, fadada a soluções apresentadas em “fórmulas
mágicas”.
A
razão técnica avançou tanto, ou se trate talvez de um eterno retorno, que antes
havia os trens para levar as pessoas para os manicômios, para a câmara de gás. Hoje, as pessoas
são levadas pelos trilhos invisíveis, estes que dizem o que devemos fazer, que
apresentam essas soluções insolúveis. Assim, não é o trilho que leva, é a mão/braço e o dito "conhecimento" do outro, que ao invés de acolher, lança essa vida entre os muros da ciência.
Esse tipo de ciência que parece querer se fechar o tempo todo em si mesma, que
tem medo de sair para fora de si mesma e se encontrar com a realidade em
sofrimento, mas, que tem também as suas possibilidades de alegria, enfim, sair
de uma rede fria para ir ao encontro de uma rede quente, essa, com mais
possíveis.
"Não sou escravo de ninguém. Ninguém, senhor do meu domínio. Sei o que devo defender e, por valor eu tenho e temo o que agora se desfaz."
Legião Urbana