Andre Dahmer

domingo, 25 de março de 2012

A vida e os avessos


Estou sentindo o dilema da música Zé e José do poeta/músico Zé Geraldo, a cada passo tendo que viver e acolher a superficialidade, a autenticidade temperada. Quero encontrar com um velho doido, chapado (bêbado), um personagem decidido, escolhendo seu caminho. Ele sabe contar, cantar as várias histórias, “história sobre a cor dos sete mares e de tesouros escondido no peito do próprio homem”.

A vida não pode ser comprimida pela necessidade voraz da sociedade, da civilização aprisionada pelo autêntico detalhe, este recebido e instituído. Ah, simplicidade escondida e que me colocam complicada, “é simples ser complicado”, mas quero eu encontrá-la em meio a essa devastação contemporânea daquilo que é mais primitivo, a roda de viola, ser criança e rir no circo com o palhaço.

Não quero ser um José de sorriso plástico, enganando a si e a todos com seu modo “autêntico” de ser. “Cabeças treinadas pra competir, semente de toda ambição”, “José progrediu, calculista e frio”.

Esse lance entre autêntico e falso provoca certa confusão, estamos acostumados a entender o autêntico como algo mais interessante. Mas para o pintor[1] que pintava a Sr. Monarch não era bem assim. O pintor via a “coisa autêntica” como o personagem puro. O falso para o pintor era visto como algo parecido com uma gravura, já o personagem do autêntico, uma fotografia. O talento da Srta. Churm em imitar e fazer os personagens “falsos” interessava mais ao pintor. Sua capacidade de variação produzia a invenção dos personagens e conseqüentemente as pinturas sairiam diferentes a cada obra. Já a Sr. Monarch posava para o pintor há dois anos e sempre impunha a mesma figura, endurecida pela autenticidade da burguesia, classe da qual se relacionava.

Sem colocar a questão aqui de luta de classes e coisas do tipo, chamo a atenção para essa relação com o falso, essa capacidade inventiva que me tira dessa ortopedia que tenta fixar a autenticidade, permitindo que a variação ganhe contornos em meio a toda essa concretude instalada no cenário social.
A vida no interior toca viola, faz doces de amendoim, prepara o café com bolo de fubá e convida você à sentar, contar os causos, a terra espera no outro dia para ser cuidada e produzir, então, não há tanta pressa. Quantos personagens, possibilidades de variar e inventar nesse cenário da vida.

Um convite para o falso, eis que me convida a vida para esse encontro. Zé, essa alegria quente que canta as histórias das estradas.


[1] Henry James A coisa autêntica.

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